segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Semáforo

Semáforo

A sensação do teu corpo e o peso do seu braço sobre meu peito ainda estão aqui...
Essa noite meu olhar se perdeu sobre teu corpo e enquanto você dormia eu insone e em transe tinha você diante de mim com tanta precisão que até chorei em silêncio.
Respirei o seu aroma, sua boca com cheiro de sorvete de creme, senti o calor do seu corpo morno , o seu sono tão plácido. Eu não dormi todo o resto da noite olhando você em pele, no instante em que olho tenho a estranha certeza de que você é a única coisa que existe e estranhamente o resto do mundo desaparece, é como se nunca tivesse sido. Eu mesmo não existo, me dissolvo na magia de olhar e sou só cenário pra magia de sua existência.
Eu já sei de suas cores claras. Se você soubesse o quanto contemplo você, nem sexo é tão bom quanto olhar você dormir, é meu ritual, é símbolo de minha devoção diante das coisas que sinto. Só assim me emociono sem hesitar diante dessa dor que é você, choro e te abraço enquanto a noite nos cobri.
É fácil ler poesias do Drummond e me achar a pessoa mais feliz do mundo, quando saio na rua não vejo semáforos, só vejo as flores amarelas de um terreno baldio perto de casa e a vida é simples como as tintas no muro, como céu e mar e como não seria se à noite tem seu cheiro, sua força e seu sono pra minha cura do mundo e das teorias falidas e inadequadas? As metas, os medos e os males são palavras o que são palavras diante de você? Ah se as pessoas que cruzam comigo na rua, que trabalho , que conheço, se soubessem de você, e se você soubesse de tudo que sinto, sei que nem sonha e tão pouco percebe meus sentimentos e assim é melhor. Mas o que me invade é a vontade de partilha de toda essa coisa boa que acontece dentro de mim. Penso que isso resolveria todos os problemas do mundo: As crises existenciais, a política de pacificação da Palestina, a sustentabilidade dos países em desenvolvimento e até a cura pra todo o mal do mundo. Mas eu não sei como isso nasce. É um mistério. Dói dentro de mim, eu quase sufoco com tanta coisa. Como pode existir de fato coisa tão difícil de ser dita? Porque entre as poesias mais belas não há a palavra justa pra de fato dizer-te.
O dia é calmo e sem grandes novidades e a noite chega prometendo seu cansaço e seu cheiro de sorvete de creme.
Os pratos na pia, o filme que diz de seu gosto me interessa, assim como me interessa sua página de jornal, seu suco e seu chá. Entro no seu universo como você entra em mim.
Seu chinelo perto do meu e seu jornal em cima da minha revista. Às vezes a gente parece casal, será que já somos casal? Não. é bobagem minha, é magia das sensações e eu não gosto mesmo de definições. Por enquanto eu só quero chorar seu sono como meu ritual sagrado e santo de te olhar, pois enquanto vida tenho as flores que saltam aos semáforos, as luzes que enfeitam mais do que clareiam, e as cores da cidade cinza. Será importante ter palavra, ter hora e data? Não. Prefiro não ter planos, as instituições matam a vontade e a dor de te ter pode se transformar em solidão.
É noite e não tenho você comigo como nas poucas noites que pareceram a eternidade.
Hoje eu não temo a morte porque é como se a vida não fosse vida e haverá nas ruas só semáforo.

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